Relatório produzido pelo núcleo de pesquisas do observatório “De Olho nos Ruralistas” destacou que 630 propriedades estão sobrepostas sobre terras indígenas em Mato Grosso do Sul. O estudo destacou que as terras estão ocupadas por latifundiários e grandes conglomerados, como Itaú Unibanco e a Cosan S/A.
Além dessas empresas, o relatório apontou ainda a família Pereira de Oliveira, produtora do “Café Lontrinha”, como detentora da Fazenda Gauchinha, de quase 2 mil hectares, localizada em Caarapó, inteiramente sobreposta à terra indígena de Dourados Amambaipeguá I. A família produz café para exportação em Ponta Grossa, no Paraná.
O estudo destacou que a maior sobreposição é a da Fazenda Terra Preta, que invade 10.151 hectares da do território Kadiwéu, propriedade em nome de Hélio Martins Coelho, ex-presidente da Associação dos Criadores de Mato Grosso do Sul (Acrissul), falecido em 2008.
Figura nas cavalgadas, Roberto Oliveira Dittmar, popularmente conhecido como “Beto Pantaneiro”, é um dos apontados como detentor de terras em área indígena. Em Aquidauana, ele administra a Fazenda Pousada Santa Cruz, voltada para o ecoturismo.
Conforme o estudo, a propriedade é registrada no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) como Fazenda Santa Cruz e Fazenda Conquista, onde 1.171 dos 5.559 hectares se encontram sobrepostos à terra indígena Cachoeirinha, do povo Terena.
Com o processo de demarcação se arrastando há mais de 4 décadas, os limites do território estão sendo reestruturados. Segundo o Cimi, tanto União como Funai apontam como principal empecilho para demarcação as ações judiciais de fazendeiros locais, inclusive Dittmar.
Conforme o levantamento, a Fazenda Santa Cruz pertencia ao pai dele, Romeu Oliveira Dittmar. Na divisão entre os herdeiros se estabeleceu uma propriedade separada, a Fazenda 23 de Março, de seu irmão,João Julio Dittmar, propriedade que também se sobrepõe aos limites da terra Cachoeirinha. São 1.101 hectares incidentes no território Terena, registrados em nome de um filho do cirurgião. “A terceira herdeira, Rosaura Oliveira Dittmar, move ações contra a Funai e, como Beto, investe no ecoturismo”, diz o relatório.
Conforme o estudo, Rosaura Dittmar mantinha ao lado do marido, Gerson Bueno Zahdi, a Pousada Cacimba de Pedra, em Miranda (MS), onde os hóspedes podiam interagir com jacarés. De acordo com o estudo, Zahdi era servidor do Ibama e, por quinze anos, foi o único criador licenciado de jacarés no Mato Grosso do Sul. Em 2019, uma operação do Ibama revelou que o ecoturismo era um subterfúgio para um intenso comércio de carnes do animal.
Na ocasião, Rosaura foi presa por crime ambiental durante a operação e a pousada perdeu sua licença de operação. De acordo com o relatório, o Itaú se conecta economicamente a quatro sobreposições de terras indígenas no Mato Grosso do Sul. De início, as ligações se aplicam à Fazenda Santa Emília, localizada no município de Caarapó, interior do Estado, propriedade registrada em nome do empresário Feres Soubhia Filho, um dos proprietários da Alvorada Produtos Agropecuários, companhia fundada em 1986, em Dourados.
Do mesmo modo, em Laguna Carapã, uma parceira de negócios da família Moreira Salles, sócia do banco, seria detentora de uma fazenda inteira sobreposta à Terra indígena Dourados-Amambaipeguá I, área, de 516,9 hectares, pertencente à Fazenda Água Branca, cuja regularidade jurídica e ambiental motivou um pedido de “investigação por parte do Ministério Público de Mato Grosso do Sul, em 2018.”, diz o levantamento.
A fazenda pertence ao espólio de João Verdier, cuja família possui duas barragens no mesmo município da sobreposição. O estudo destaca a participação de Maurício Verdier, então sócio do banqueiro estadunidense David Rockefeller e do brasileiro Walther Moreira Salles, na Fazenda da Bodoquena, de 450 mil hectares, localizada no pantanal sul-mato-grossense. Por fim, as ligações do banco se estendem à sobreposição da terra indígena de Ypoi/Triunfo, em Paranhos.
Conforme o documento, a região, a exemplo da Fazenda Água Branca, a Fazenda Ponte de Tábua incide quase totalmente no território indígena, sendo 433 hectares de uma área total de 434,7 hectares. O dono é Sebastião Nilson Mendes, denunciado em 2011 pelo Ministério Público do Paraguai, junto a outro brasileiro, o fazendeiro Ali Mohamed Osman, por crime ambiental cometido pela empresa Issos Greenfield International S.A.
Segundo a Oxfam Paraguai, a subsidiária do Itaú no país vizinho é sócia na empresa. Consta ainda uma propriedade do antigo Unibanco, incorporado pelo Itaú em 2008, em área sobreposta à terra indígena Kadiwéu, cerca de 1,9 hectare da Fazenda Morro do Pantanal, em Corumbá, invadindo uma terra já homologada e regularizada há quatro décadas.
Na mesma linha do banco, a Cosan, empresa ligada ao setor sucroalcooleiro, também possui, segundo o observatório, conexões com propriedades rurais sobrepostas à terra indígena de Dourados- Amambaipeguá I, do povo Guarani Kaiowá.
As ligações, de acordo com o estudo, estão em 238,5 hectares na fazenda Campanário, em Laguna Carapã, interior do Estado. A fazenda pertence à família Rezende Barbosa, historicamente ligada ao Grupo Cosan. O dono das terras foi acionista do grupo controlado por Rubens Ometto, entretanto deixou o acordo de em 2019.
Para além do grupo Cosan, o relatório destaca as participações das usinas Santa Adélia e Três Barras. No caso da primeira, o território estaria quase totalmente sobreposto a uma terra indígena em Fátima do Sul, propriedade registrada em em nome de uma agropecuária da família Bellodi, controladora da usina que integra o sistema Copersucar, maior comercializadora de açúcar e etanol do mundo.
Na mesma linha, a fazenda Três Barras avança 130 hectares dentro da mesma terra indígena, fazenda pertencente à Usina Três Barras, que desde 2018 passou a ser controlada pela Vita Bioenergia, após um investimento de R$ 461 milhões.