A Câmara Municipal de Campo Grande e dois sindicatos que representam os auditores fiscais recorreram ao TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) contra a decisão de segundo grau que manteve suspenso o reajuste de 66,77% no salário da prefeita Adriane Lopes (Patriota). Por ser o teto constitucional, a categoria requer que o aumento seja mantido para que tenha os vencimentos revistos.
O Sindafir/CG (Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Municipal) sustenta que, se a prefeitura estivesse de fato com alto comprometimento de recursos públicos, não estaria contratando servidores em diversas áreas.
“Somente entre o período de 01/10/2022 a 17/03/2023 foram feitas mais de 3.400 nomeações pela prefeitura de Campo Grande, acarretando em um impacto financeiro significativamente maior do que causaria a Lei 7.005/2023. Nos meses de março e abril de 2023 houve convocação de servidores públicos aprovados em concursos e abertura de processos seletivos para contratação temporária”, escreveram os advogados Marcelo Araújo Kroetz, Armando Suárez Garcia, Stefano Alcova Alcântara e Marcos Paulo da Silva Saifert.
Além disso, a prefeitura ainda estaria concedendo incentivos fiscais, outro fato que sustentaria que o município teria como arcar com reajuste da prefeita e para a categoria.
“Ademais, a administração municipal vem concedendo anistias e descontos em relação a verbas de arrecadação, o que também vai de encontro com o fundamento da decisão. Sendo assim, caso o orçamento com pessoal estivesse fora dos parâmetros legais, a administração municipal não estaria contratando pessoal, muitos sem concurso, aumentando salários e concedendo descontos e anistias de verbas de arrecadação”, pontuaram os advogados.
Já o Sindafis (Sindicato dos Trabalhadores no Serviço de Fiscalização) apontou precedente aberto pelo TJ em que foi mantido o reajuste do salário do prefeito de Dourados no ano passado.
“A bem da verdade, os reflexos financeiros advindos com a fixação do subsídio do Prefeito,para o município de Dourados denominou-se ‘limitação remuneratória dos servidores públicos municipais’ e para o município de Campo Grande denominou-se ‘aumento ao funcionalismo’”, destacam os advogados Elenice Pereira Carille e Ademir Amâncio.
Por sua vez, a Câmara reforça o argumento dos dois sindicatos, de que o princípio da congruência não foi observado. Ou seja, a decisão de primeira instância foi além da petição inicial.
A liminar levou em conta a possibilidade de violação da Lei de Responsabilidade Fiscal, fato que não foi mencionado no pedido de suspensão da Lei 7.005.
“Os fundamentos que embasam a ratio decidendi da decisão impugnada não são abordados pelo recorrente nas razões recursais e nem pelo próprio magistrado na decisão interlocutória do douto juízo a quo, não restando outra conclusão senão a de que o provimento judicial ora em foco extrapolou os contornos estabelecidos para a lide”, observou o procurador jurídico Luiz Gustavo Lazzari.
Os agravos internos foram distribuídos à desembargadora Jaceguara Dantas da Silva, da 5ª Câmara Cível do TJMS, que já tinha mantido o reajuste suspenso. Em despacho, a magistrada deu 15 dias para o autor da ação popular, o advogado Douglas Prado, se manifestar.
Justiça suspendeu aumento de salário da prefeita de Campo Grande em duas instâncias
O juiz Marcelo Ivo de Oliveira, da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, decidiu pela suspensão do reajuste em março e chegou a reconhecer que tanto a Lei Orgânica como a Constituição Federal – e até a Constituição do Estado – não proíbe reajuste para prefeito e vice no decorrer do mandato, mas a situação não está pacificada na Justiça.
Ele seguiu o atual entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal), que aplicou o princípio da anterioridade também ao Executivo. Além disso, destacou que o STF ainda está julgando a constitucionalidade de leis como a 7.005, que reajuste subsídio de prefeitos durante o mandato. Como o caso ainda está em andamento, valeria o atual entendimento da corte.
Logo, haveria risco de dano aos cofres municipais caso o aumento fosse mantido. “O perigo de dano também está presente, eis que considerando-se que os pagamentos dos novos subsídios estarão se efetivando mês a mês, é certo que quanto maior o tempo que se levar para cessar tal recebimento, maior será o prejuízo ao erário”, observou.
Assim, Oliveira decidiu suspender os efeitos financeiros da lei, frisando que a medida pode ser revista ao fim da ação e que os servidores afetados poderão receber o reajuste retroativamente.
Além disso, o juiz deferiu o ingresso do Sindafir/CG (Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Municipal de Campo Grande) e do Sindafis (Sindicato dos Trabalhadores no Serviço de Fiscalização) no processo, como assistentes, já que representam a categoria afetada e têm interesse no resultado.
A Câmara recorreu, mas a desembargadora Jaceguara Dantas da Silva, da 5ª Câmara Cível do TJMS, manteve a liminar. Para ela, a prefeitura “se encontra no limite prudencial das despesas com pessoal”.
A magistrada escreveu ainda que o “aumento de subsídios aprovado pela Câmara Municipal implicará em agravamento substancial da situação orçamentária, sujeitando o Município de Campo Grande a graves sanções decorrentes da Lei de Responsabilidade Fiscal”.
Ação questiona aumento do teto do funcionalismo municipal de Campo Grande
Esta ação popular foi impetrada pelo advogado Douglas Barcelo do Prado. Na peça, ele considerou que o aumento é lesivo aos cofres públicos.
Além disso, o advogado argumenta que o reajuste de agentes políticos, e por consequência dos servidores que recebem o teto, só é permitido para o próximo mandato, o que não é o caso da Lei 7.005.
“Demonstradas as razões da ação que se move em defesa da legalidade, moralidade e do patrimônio público, resta cabalmente demonstrado, ao menos em sede de cognição sumária, que a Lei 7.005 de 28 de fevereiro de 2023 concedeu de forma concreta reajuste indevido nos subsídios da prefeita e vice-prefeito de Campo Grande, fazendo-se imperiosa a concessão da tutela de urgência a fim de determinar a suspensão do reajuste por ela perpetrado nos subsídios do prefeito, vice-prefeito, secretários municipais e dirigentes de autarquias decorrentes de tal lei”, concluiu.
Prefeitura garante à Justiça que é contra aumento para Adriane
A prefeitura de Campo Grande se manifestou favorável à ação popular. No fim de fevereiro, a prefeita declarou que iria judicializar a questão por entender que o município não tem recursos para bancar o aumento. “Esse projeto teve começo, meio e fim no Legislativo e não no Executivo. Eu não acho justo, sou contra o aumento do meu subsídio”, declarou.
O procurador-geral do município, Alexandre Ávalo, destaca que a lei produziu efeito imediato, ou seja, o reajuste passou a valer logo após a promulgação, em 28 de fevereiro, produzindo efeito a partir de 1º de março.
“Deve ser considerado que, para a implantação dos subsídios fixados, devem ser respeitadas as regras previstas na legislação, em especial à observância dos limites de despesa com pessoal, fixados na Lei Complementar Federal N.º 101, de 4 de maio de 2000, mormente a comprovação da adequação orçamentária e financeira do gasto, a sua previsão na LOA [Lei Orçamentária Anual] e a compatibilidade com a LDO [Lei de Diretrizes Orçamentárias] e com o PPA [Plano Plurianual], além de estar acompanhada da estimativa do impacto orçamentário financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes”, pontuou.
Assim, Ávalo destaca que a prefeitura está impossibilitada de aumentar ainda mais os gastos com pessoal “visto que já está no limite do possível, sob pena de sofrer graves sanções,tais como: corte dos repasses constitucionais, proibição de realizar operações de crédito, etc., em prejuízo da coletividade”.
A Lei 7.005 ainda estaria em conflito com a Lei de Responsabilidade Fiscal, “em que de um lado encontra-se uma lei municipal de efeito imediato e de outro lado uma lei federal que prescreve responsabilidades e punições graves em face seu descumprimento”.
Ação em segundo grau também questiona reajuste
Um outro processo foi impetrado contra o aumento. Trata-se de uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade), apresentada pelo Simte/PMCG (Sindicato dos Trabalhadores Públicos em Enfermagem) e pelo SindGM (Sindicato dos Guardas Municipais).
Na petição inicial, o advogado Márcio Almeida cita que a Constituição Federal e a Lei de Responsabilidade Fiscal proíbem a concessão de vantagem financeira se não houver recursos suficientes.
Além disso, ele argumenta que a Lei 7.005, que beneficia uma pequena parcela de servidores municipais que recebem o teto do funcionalismo, enquanto o município não consegue atender as demais categorias.
“A administração deixar de atender as demais categorias da rede municipal, como por exemplo, é inerte ao pagamento de vantagens à Guarda Civil Metropolitana, à enfermagem, etc., […] porém, mesmo assim a administração pública incorre na justificativa de ausência financeira/orçamentária para o pagamento destes benefícios às categorias”, pontuou.
Cita ainda que a prefeitura está com 57,02% da receita comprometida com gastos de pessoal, acima dos 51,3% do limite prudencial previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal. Pede manifestação da prefeitura, Câmara, MPMS (Ministério Público do Estado) e liminar que proíba o município de pagar o reajuste, além de declarar a Lei 7.005 como inconstitucional.
A ADI foi distribuída ao desembargador Vilson Bertelli. O magistrado ainda não emitiu uma decisão.
Após a abertura do processo, o Sindafir/CG pediu para ingressar no processo como amicus curiae, ou seja, para acompanhar a ação por ter interesse no resultado. A entidade lega no pedido de ingresso na ADI que a categoria recebe o teto do funcionalismo, logo, pode ser afetada caso o reajuste seja derrubado. “A matéria a ser analisada na presente lide reflete diretamente sobre os filiados do sindicato Suplicante, haja vista que, caso os pedidos da presente ação sejam acolhidos, os seus filiados, assim como vários outros servidores municipais, serão diretamente impactados”, destaca a defesa.