Depois de três anos e cinco meses, o Conselho Nacional de Justiça decidiu abrir PAD (Procedimento Administrativo Disciplinar) contra o ex-presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, desembargador Divoncir Schreiner Maran. Por 9 a 4, o plenário concluiu que há indícios contra o magistrado por ter concedido habeas corpus ao chefe do tráfico internacional, Gerson Palermo.
No feriado de Tiradentes, suprimindo instância, sem ouvir o Ministério Público e sem exigir exames médicos, Maran concedeu prisão domiciliar para o narcotraficante, apesar de estar condenado a 126 anos de prisão em regime fechado. Fora da cadeia, o bandido rompeu a tornozeleira eletrônica e desapareceu.
No julgamento realizado na manhã desta terça-feira (5), o relator do processo e corregedor-nacional de Justiça, o ministro Luiz Felipe Salomão, listou as irregularidades cometidas por Divoncir Schreiner Maran para beneficiar Palermo. Ele frisou que se trata de um dos maiores traficantes de drogas do País.
Salomão frisou que o ex-presidente do TJMS não exigiu exames médicos para analisar a situação de Gerson Palermo antes de conceder o habeas corpus. “Não havia surto de covid-19 no presídio”, frisou, acrescentando que nem havia pedido de transferência do criminoso.
“Houve supressão de instância”, citou o conselheiro Vieira de Mello Filho, que também destacou o fato do desembargador não ter ouvido o MPE para decidir pela soltura do narcotraficante.
A conselheira Salie Sanchotene pontuou que Maran não ouviu o juiz de primeiro grau, que ainda não tinha analisado o habeas corpus protocolado pela defesa de Palermo. Para a conselheira Jane Granzoto, há indícios que precisam ser melhor apurados, principalmente, pelo fato do narcotraficante ter sido condenado a 126 anos de prisão.
O conselheiro Richard Pae Kim apontou outro agravante contra Divoncir Schreiner Maran. Após conceder habeas corpus a Palermo, o desembargador teria negado o mesmo benefício, direito à prisão domiciliar a outros três detentos no mesmo dia, em decorrência da pandemia da covid-19.
Também foi considerado estranho que uma outra funcionária, que não fazia mais parte do gabinete de Maran, ter sido chamada para despachar o habeas corpus de Gerson Palermo. Ela estava designada há mais de mês para trabalhar no gabinete de outro desembargador.
Presidente do Supremo Tribunal Federal e do CNJ, a ministra Rosa Weber, também votou pela abertura da investigação. Ela frisou que existe a necessidade de maior apuração dos indícios contra o ex-presidente do TJMS. Conforme a ministra, caso fosse o julgamento, ela pediria vistas para analisar melhor antes de optar pela condenação do magistrado.
Luiz Fernando Bandeira de Mello defendeu Divoncir e que narcotraficante Gerson Palermo teria direito a prisão domicilair com base em decisão do CNJ (Foto: Reprodução)
Por outro lado, quatro conselheiros votaram contra a abertura do PAD para investigar Divoncir Maran. A divergência foi aberta pelo conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello, que se referiu a Palermo, condenado a 126 anos, como “doutor”.
Mello pontuou que o CNJ baixou portaria orientando os magistrados a liberarem os presos idosos e doentes para cumprirem prisão domiciliar em decorrência da pandemia. Ele citou que mais de 32 mil presos foram liberados com base na decisão do conselho.
Sobre a convocação da servidora, que estava lotada em outro gabinete, o conselheiro disse que o desembargador de plantão tinha autonomia para chamar quem quisesse para agilizar o trabalho.
O conselheiro citou ainda o caso de um juiz no Paraná, que teria liberado um chefe do PCC, a facção criminosa paulista, que também rompeu a tornozeleira e fugiu. No entanto, conforme ele, o CNJ não abriu PAD para investigar o magistrado paranaense. Uma conselheira explicou que o juiz do Paraná exigiu exames médicos antes de conceder o HC.
Luiz Fernando Bandeira de Mello pontuou ainda que Gerson Palermo estava em uma lista de presos que poderiam ser beneficiados com a prisão domiciliar por causa da covid-19. Sobre o fato de Palermo ser piloto de avião, ele citou que o ex-senador José Maranhão pilotou aviões até os 80 anos, mas acabou morrendo em decorrência da covid-19.
Além de Mello, votaram contra a abertura de sindicância contra Maran os conselheiros Marcos Vinícius, Marecello Terto e Silva e Mário Goulart Maia.
Criado para fiscalizar e garantir agilidade do Poder Judiciário, o CNJ levou três anos e cinco meses para decidir pela abertura de sindicância contra Divoncir Schreiner Maran. Ele concedeu habeas corpus a Palermo em 21 de abril de 2020.
O desembargador Jonas Hass da Silva revogou o habeas corpus no dia seguinte, mas já era tarde demais. O narcotraficante fugiu e até hoje não foi localizado pela polícia.